Denúncia da propina está na Justiça
Victor Vidal
Depois de um ano de
investigações da Polícia Civil e do Ministério Público, o Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Norte recebeu a denúncia resultante da Operação
Impacto e abriu processo contra 22 pessoas acusadas de participação num
esquema de pagamento de propina a vereadores para garantir a derrubada
de vetos do prefeito Carlos Eduardo a emendas do Plano Diretor de Natal,
durante votação na Câmara Municipal, em julho de 2007.
Treze
vereadores foram denunciados pela prática do crime de corrupção
passiva: Emilson Medeiros, Dickson Nasser, Geraldo Neto, Renato Dantas,
Adão Eridan, Adenúbio de Melo, Aluisio Machado, Carlos Santos, Júlio Protásio
da Silva, Aquino Neto, Edson ""Sargento"" Siqueira, Salatiel de Souza e
Edivan Martins. Pelo mesmo motivo, foi denunciado o suplente de
vereador Sid Fonseca, que na época da votação substituía Adão Eridan na
Câmara.
Apontado como um dos corruptores
do esquema, o empresário Ricardo Abreu, proprietário da Abreu Imóveis,
foi denunciado por corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Outras pessoas
do seu vínculo familiar e profissional também foram indiciadas: sua
esposa Cristiana Barreto do Amaral Abreu, por corrupção ativa; os
advogados José Cabral Pereira Fagundes e Joseilton Fonseca da Silva; e o
consultor imobiliário João Francisco Garcia Hernandes, todos acusados
de lavagem de dinheiro.
Também foram
denunciados por corrupção passiva três funcionários públicos lotados na
Câmara Municipal de Natal: Klaus Charlie Nogueira Serafim de Melo,
assessor de Emilson Medeiros; Francisco de Assis Jorge de Souza, do
gabinete de Geraldo Neto; e Hermes Soares Fonseca, assessor do
presidente da Câmara Dickson Nasser. Eles, segundo a denúncia, foram
incumbidos pelos seus superiores hierárquicos de cumprirem a ordem
manifestamente ilegal de arrecadação da vantagem indevida e distribuição
do dinheiro pago pelos empresários.
O
relatório do MP diz que, no curso do processo legislativo de elaboração
do novo Plano Diretor de Natal, durante o primeiro semestre e início do
segundo semestre de 2007, os vereadores denunciados pelo Ministério
Público aceitaram promessa de vantagem indevida para que, no exercício
dos mandatos, votassem conforme os interesses de um grupo de empresários
do ramo imobiliário e da construção civil ""que se formou para
corromper, mediante pagamento de dinheiro, as consciências dos
representantes do povo natalense"".
Os
promotores afirmam que os vereadores foram estimulados pelo oferecimento
e a promessa da vantagem indevida, em valores iguais ou superiores a R$
30 mil para cada um deles, obedecendo a uma tabela previamente
escalonada de valores. ""Formaram um grupo coeso que se articulou entre
si durante todo o processo legislativo mencionado sob a promoção,
organização e direção do denunciado Emilson Medeiros dos Santos, que,
como Engenheiro Civil, em face das suas relações pessoais com
empresários dos ramos da construção civil e imobiliário, funcionou como
elo de ligação entre os edis e os empresários"", diz um trecho da
denúncia.
O MP atribui ao presidente da
Câmara, Dickson Nasser, o que seria a segunda posição na hierarquia do
esquema, tendo papel inferior apenas a Emilson Medeiros. Além disso
Nasser é acusado de promover e organizar a cooperação no crime e dirigir
a atividade dos demais agentes. Segundo o MP, em razão da aceitação da
promessa da vantagem indevida, os vereadores denunciados votaram, com
êxito, conforme acertado com os empresários corruptores, pela rejeição
dos vetos do Chefe do Executivo às emendas parlamentares ao Plano
Diretor de Natal, na sessão da Câmara Municipal do dia 03 de julho de
2007.
CORRUPÇÃO
De
acordo com a denúncia, o empresário Ricardo Abreu e sua esposa
Cristiana Abreu ofereceram e pagaram de R$ 100 mil aos vereadores
denunciados por meio de dois cheques de R$ 50 mil. Os pagamentos foram
ordenados por Ricardo Abreu, na qualidade de dirigente da pessoa
jurídica Abreu Imóveis, e assinados por Cristiana Abreu, favorecendo
nominalmente Francisco de Assis Souza, assessor de Geraldo Neto, que
teria sido destacado para esse fim pelo grupo de vereadores do suposto
esquema.
Os denunciados José Cabral
Pereira Fagundes, João Francisco Garcia Hernandes e Joseilton Fonseca da
Silva, em co-autoria com Ricardo Abreu, são acusados de forjar um
contrato de compra e venda de imóvel com o propósito de dissimular a
movimentação, a origem, o destino e a natureza do dinheiro pago aos
vereadores.
Segundo a denúncia, para
forjar a transação, Ricardo e Cristiana Abreu emitiram dois cheques de
R$ 50 mil em favor de Francisco Assis Jorge de Souza, que figura como
vendedor de um apartamento no edifício Riomar, na Avenida Deodoro da
Fonseca, em Natal. João Francisco Garcia Hernandes e Joseilton Fonseca
da Silva apresentam-se como testemunhas no documento. Ricardo Abreu
consta no documento como comprador do imóvel.
O
documento de compra e venda, cuja cópia foi apresentada na denúncia,
foi apreendido em diligência de busca e apreensão na residência Ricardo
Abreu no dia 27 de julho do ano passado. Segundo o MP, o mesmo
documentofirmou-se como álibi de Ricardo e Cristiana Abreu no inquérito
policial a explicação de que os referidos cheques, no valor total de R$
100 mil significaram a primeira parcela do pagamento da suposta compra
do apartamento de José Cabral Pereira Fagundes, ""dissimulando, como se
fora negócio lícito, a movimentação, a origem, a destinação ilícita e a
natureza dos valores pagos aos vereadores"", denunciam os promotores.
Entidades de Mãe Luíza deflagram denúncia
No
dia 7 de maio de 2007, o Ministério Público iniciou investigações para
apurar denúncias publicadas na imprensa e uma representação formulada
pelo Fórum de Entidades de Mãe Luíza dando conta de um suposto esquema
de corrupção de vereadores para aprovação de emendas ao projeto de lei
do novo Plano Diretor de Natal. As especulações ganharam contornos reais
no dia 28 de junho, quando a procuradora do município Marise Costa
procurou o Ministério Público para relatar uma conversa que teve com o
suplente de vereador Sid Fonseca, na época substituindo Adão Eridan, que
estava de licença médica.
Em depoimento,
a procuradora contou que no dia 27 de junho foi procurada por Sid
Fonseca para tratar sobre a votação do Plano Diretor. Ele denunciou à
procuradora que estava sendo pressionado por Adão Eridan para votar
contra o veto do prefeito a três emendas do projeto de lei. Isso porque,
segundo o relato, havia um esquema armado na Câmara para derrubar os
vetos em troca de dinheiro. Sid contou a ela que Adão Eridan estava o
pressionando porque já tinha acertado o voto e queria receber o dinheiro
do acordo. Segundo o relato de Sid Fonseca, Adão Eridan disse que
estava com pendências financeiras e precisava receber os R$ 15 mil
acertados.
Diante dos fatos relatados
pela procuradora Martise Costa, o Ministério Público expediu imediata
requisição de inquérito policial à Delegacia de Defesa do Patrimônio
Público e requereu ao Poder Judiciário, no dia 29 de junho, a
interceptação de comunicações telefônicas de 16 dos 21 vereadores do
município, indicando os números telefônicos cadastrados junto ao
Cerimonial da Prefeitura Municipal de Natal. Somente nesta denúncia são
reproduzidos 114 diálogos entre os denunciados.
No
dia 11 de julho de 2007, o MP e a Polícia Civil deflagaram a Operação
Impacto, que culminou de imediato em 16 mandados de busca e apreensão
nos gabinetes parlamentares, residências e um escritório dos vereadores
Dickson Nasser, Geraldo Neto, Adenúbio Melo, Renato Dantas, Emilson
Medeiros, Júlio Protásio, Salatiel de Souza e Sargento Siqueira.
Além
de documentos, CD"s e computadores, foram apreendidas quantias em
espécie no valor de R$ 77 mil na casa de Geraldo Neto, R$ 12,4 mil na
casa de Emilson Medeiros e de R$ 5 mil embaixo do tapete do carro de
Sargento Siqueira. Com a autorização da quebra do sigilo telefônico de
16 dos 21 vereadores, o MP conseguiu interceptar diversos diálogos nos
quais tratam da divisão do dinheiro relativo à propina acertada
anteriormente que levaram os promotores a confirmar a existência ""do
grave esquema de corrupção"".
No decorrer
das investigações, o delegado Júlio Rocha descobriu ramificações e
chegou a cumprir mandado de busca e apreensão na sede da Abreu Imóveis,
na casa do proprietário da imobiliária, Ricardo Abreu, e no escritório
de contabilidade da empresa. Depois, Ricardo Abreu e sua esposa
prestaram depoimento. O delegado também ouviu vários assessores de
gabinetes da Câmara Municipal.